RITA GASPAR VIEIRA
DEZEMBRO 2014
01

FICHA TÉCNICA
Marca D'Água #1
2014
Impressão a jato de tinta sobre papel de algodão
43 x 29,78 cm
1/3+P.A.


 

Assentar a água

Rita Gaspar Vieira foi a quarta artista convidada a realizar uma obra especificamente para ser difundida por email pelo EMPTY CUBE. A fotografia, da série “Marca D'Água #1”, 2014, impressão a jacto de tinta sobre papel de algodão, faz parte de um projecto fotográfico inédito.
A imagem que Rita Gaspar Vieira apresenta é um registo fotográfico de um processo de trabalho mais alargado, que se intensificou no decorrer da investigação prática para a sua tese de doutoramento. Contudo, o espectro da investigação académica não condicionou o desenvolvimento desta série fotográfica, sendo apenas um momento desse processo, que teve outros desenvolvimentos, materializados noutras obras de configuração escultórica apresentadas em contextos expositivos.
O título da obra, “Marca D'Água #1”, reenvia-nos para uma técnica de marcação de papel que teve o seu aparecimento no séc. XIX e que permitiu controlar a autenticidade de um certo tipo de papel. A técnica, um processo de estampagem sobre papel húmido, deixa uma marca que só é possível ver à transparência sob a incidência da luz, como é reconhecível numa nota, ou numa folha de papel Fabriano, material e lugar da sua origem. No trabalho de Rita Gaspar Vieira esta estampagem obedece a um processo inverso, quase como uma pintura sobre fresco, no sentido em que a artista, que fabrica a pasta de papel que utiliza nestas obras, emprega camadas de fibras de algodão que constituem uma pasta húmida e que aderem entre si até à fase da secagem. A marca de água, numa linguagem mais corrente, cobre no seu trabalho todo o processo entre o assentamento da pasta e a sua secagem absoluta, revelando-se assim em camadas que descobrem diferentes sedimentos, e desta forma diferentes momentos sequencialmente anteriores. É um processo de materialização do passado, metáfora da memória enquanto desiderato do acto de fazer sob as condições atmosféricas que nos devolvem à humanidade terrena. A forma angular que a figura escultórica exibe no registo fotográfico acentua essa ligação à faktura, percorrendo uma linhagem construtivista na secção cúbica que deixa a sua superfície alva e diáfana libertar-se em finas e dúcteis camadas, revelando duas placas quadrangulares que pertencem ao revestimento do espaço arquitectónico do EMPTY CUBE. A memória do seu acto, enquanto artista, é simultaneamente o seu momento projectivo de partilha com o projecto e os seus intervenientes. A marca de água é nesta obra um processo de revelação e de resguardo de todas as marcas indeléveis e singulares que corporalizam o projecto EMPTY CUBE.

João Silvério
Janeiro 2015